Sem dúvidas, pilotar uma Royal Enfield é uma experiência diferente de tudo que já passou pela redação da MOTOCICLISMO nos últimos anos. A moto parece ter saído da linha de produção da marca nos anos 1950 e viajado no tempo para chegar aos dias atuais, uma autêntica moto retrô! A marca, que em 1901 produziu sua primeira moto em Redditch, Inglaterra, tem atualmente sua unidade fabril em Chennai, no extremo sul da Índia, país onde iniciou a produção em 1956 e desde 1994 é gerenciada pelo competente Grupo Eicher.
Após muita especulação, chegou ao Brasil em maio de 2017 e com uma operação bem pé no chão, com as motos importadas e apenas uma concessionária, localizada na capital paulista. A marca comercializa três modelos: Bullet, a mais simples e acessível, em linha desde 1932(!); a Continental GT, uma café racer, lançada em 1964 e relançada em 2013, devidamente atualizada; e a Classic, principal modelo, com muitas opções de cor e que ganhou outras três na edição especial Redditch, lançada no Salão Duas Rodas 2017. A unidade da Classic que avaliamos édesta série, uma viagem ao passado e uma baita lição sobre como curtir mais uma motocicleta (saiba mais aqui).
O “coração” da Classic é um grande monocilíndrico de 499 cm³, com direito à nostálgica opção do pedal de partida (cuidado com a canela!). Como de costume, essa concepção — com duas válvulas e comando OHV — entrega mais torque que potência. No dinamômetro, foram bons 3,33 kgf.m de torque na roda antes dos 3 000 rpm, com apenas 19 cavalinhos de potência. Combina com o DNA da Classic, mas funcionaria muito bem em uma custom, prova disso é que lá fora a marca tem a Thunderbird, com o mesmo motor. Com a injeção eletrônica Keihin, ganhou suavidade e linearidade nas solicitações do acelerador e melhor funcionamento em baixas rotações. A grande caixa preta próxima ao motor, do lado esquerdo, é parte do sistema de recirculação dos gases, necessário para esse motorzão ser aprovado nos rigorosos parâmetros de emissão de poluentes do PROMOT 4, adequação necessária também para o modelo entrar no mercado europeu, outro alvo dos planos da matriz.
Com 500 cm³ em apenas um cilindro e sem balanceiros ou recursos tecnológicos para reduzir a vibração, ela está sempre presente, então a dica é andar na maior marcha possível, em quarta e quinta sempre que possível, o que alivia a vibração, e a moto fica mais confortável. A marca está usando o ótimo óleo Motul 5100 (15W50) na Classic, o que contribui para engates suaves.
Na cidade, as respostas do motor são satisfatórias e não falta desempenho em nenhum momento, mesmo com garupa. Na estrada, a partir de 100 km/h, não tem jeito… Sem sexta marcha, a vibração é elevada e incomoda. O consumo durante o teste, com mais de 80% em uso urbano, foi de 21,4 km/l, mas se a sua cidade não for um engarrafamento permanente é possível passar dos 25 km/l sem esforço. No espartano painel, nada de indicador de nível de combustível. Fique atento à luz-piloto do lado direito, que acende indicando que se entrou na reserva, de cerca de 2,5 litros.
A mecânica da moto é supersimples, de fácil manutenção e sua robustez é famosa pelo mundo. Tanto que anualmente a marca promove um passeio para proprietários pelas estradas do desafiador Himalaia, cordilheira que abrange cinco países e nela está o Monte Everest, a montanha mais alta do planeta! Lá, as Royal Enfield superam desafios que muito dono de maxitrail jamais teve coragem de enfrentar, ou seja, é a maior prova de que as motos aguentam qualquer perrengue!
A posição de pilotagem é bem confortável, praticamente com a coluna reta e com as pedaleiras levemente avançadas. O espaçoso assento, com molas para o piloto, e as suspensões — que trabalham muito bem — supreenderam. Sinceramente, esperávamos menos. A garupa é removível, e no teste, ao pilotar acompanhado, o passageiro tem conforto garantido. Uma novidade da Classic é o sistema de freios, que ganhou o sistema antibloqueio (ABS) e disco na roda traseira. O sistema é da Bybre, segunda linha da Brembo, que equipa, por exemplo, as pequenas KTM Duke. O comportamento, aliado aos pneus Avon Roadrider, foi satisfatório, com frenagens seguras e estáveis em diferentes velocidades. No molhado, sentimos que a aderência do pneu poderia ser melhor. Antes, contávamos com o Metzeler Lasertec, pneus que, particularmente, preferimos.
Contudo, a Classic mostrou durante o teste a que veio. Realmente diferenciada e adequada ao uso urbano, sua ciclística e conforto impressionaram, e o motor, apesar da idade do projeto, está com a saúde em dia. Sem dúvidas, ninguém fica indiferente a ela!
CONCLUSÃO
Testar uma Classic sem resetar a cabeça cheia de parâmetros de outras motos seria injusto com esta Royal Enfield, que tem, sim, um público cativo, específico e que vem crescendo. Nela, o passeio é sem pressa, como quando saboreamos um bom vinho. Quem compra uma moto dessa não quer ser o mais rápido, nem fazer curvas a la Valentino Rossi. Quer apenas curtir o melhor do motociclismo, que são as boas amizades, andar na paz e ter sob seu comando uma moto com personalidade, que tem história. Opção de baixo custo para quem busca diferenciação nas ruas, afinal, é uma moto clássica 100% funcional!
Texto: Marcelo Barros
Fotos: Renato Durães