Texto: Aldo Tizzani
Fotos: Triumph
Quando a Triumph anunciou que traria de volta uma scrambler de capacidade cúbica acima dos 900 cm³ da atual Street Scrambler, muita gente comemorou. Mas, no momento que a casa de Hinckley revelou que a moto seria mais forte no off-road para honrar o legado deixado por modelos como a T-120TT, a T120C e a icônica TR6’C, que costuma ser ligada com frequência ao ator e piloto Steve McQueen, a ansiedade para andar nela aumentou.
Revelada no fim de outubro de 2018, a Scrambler 1200 chegará ainda no primeiro semestre ao Brasil nas mesmas duas versões disponíveis lá fora: XC e XE, esta última topo de linha e feita para sair do asfalto. E, para conferir se a nova clássica moderna é mesmo tudo isso que a Triumph promete, aceitamos o convite da marca inglesa para testá-la em Portugal, em seu evento global de lançamento, fomos a única revista brasileira presente. Que orgulho!
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Os test-rides foram divididos em dois dias. No primeiro, a Scrambler XE (topo de linha) foi avaliada na Wim Motors Academy, complexo de pistas off-road que recebe até pilotos europeus que fazem pré-temporada para o Rally Dakar. O segundo dia foi dedicado à versão XC, exclusivamente para acelerar na estrada por um percurso de mais de 200 quilômetros entre as montanhas que cercam Faro, cidade que fica cerca de 280 quilômetros de Lisboa.
A chegada até a pista off-road foi um tanto tumultuada, já na primeira tentativa de deixar o Brasil o voo da TAP teve um problema técnico e não foi autorizado a decolar. No dia seguinte seguimos para a Europa, porém a conexão (olha ela aí de novo) entre Lisboa e Faro sofreu atraso de mais de duas horas, em função do forte nevoeiro. Resumindo, tivemos apenas 1h30 para rodar com a Scrambler 1200 XE na terra, mas nem por isso a experiência foi prejudicada. Na primeira parte pude avaliar a moto por estradas vicinais e trilhas, na segunda sessão do teste, foi a vez de curtir a pista de flat track, emocionante.
Então chegou a tão esperada hora de subir na moto depois de mais de 24 horas no deslocamento entre Brasil e Portugal. A XE impressiona pelo porte e altura em relação ao solo, mas o banco reto não dificulta a subida na moto. Apoio a ponta dos pés no chão e equilibro a moto. Com a chave presencial no bolso, era momento de ouvir o ronco do motor de dois cilindros, 90 cv de potência máxima e 11 kgf.m de torque. Ao dar “start” no botão do punho direito, o ronco do propulsor propaga um sedutor som médio-grave, que instiga o querer acelerá-la. De cara optei pelo modo de pilotagem Off-Road Pro (há outras cinco opções de mapeamento do motor, exclusividade da versão XE), e nele não há nenhum tipo de interferência eletrônica para a tocada na terra, pronto para deixá-la deslizar.
Os pneus Metzeler Tourance de uso misto montados na Scrambler 1200 XE faziam a moto deslizar controladamente pelo piso molhado. A moto saia de traseira nas acelerações, empolgando na tocada, aproveitando o torque abundante em baixas e médias rotações, assim não foi preciso exagerar nos giros. Nessa “rasgada”, a moto se mantinha no trilho, sem sustos. A XE tem suspensões de longo curso, ângulo de cáster e trail maiores, comparados com a versão XC, o que permite exageros inusitados no off-road. O porém nessa condição de uso mais esportivo com trocas de marchas constantes foi o calor vindo do motor, com a temperatura amena (18ºC) não chegou a incomodar, mas no calor…
Esse teste durou uma hora pelas cercanias do Wim Motors Academy, que fica em Boavista dos Pinheiros, a 150 km de Faro. A região oferece todo tipo de topografia e obstáculos. A moto superou a lama, os buracos e poças d’água, destacando o excelente conjunto ciclístico. As suspensões de longo curso da Scrambler XE têm três vias de regulagem, o que possibilita os ajustes de acordo com o terreno e a tocada, e não ameaçaram chegar ao final de curso. Já os freios com pinças radiais (Brembo), dignos de superesportiva, foram precisos em todas as condições de uso e é preciso tomar cuidado com sua pegada. A Scrambler 1200 entra no páreo com qualquer moto aventureira!
Outro detalhe importante para quem gosta de pilotar de pé: as pedaleiras largas de perfil dentado são ótima base para os pés. Em conjunto com o guidão largo, melhora a ergonomia e facilita o controle no off-road, com bom encaixe e liberdade de movimentos sobre a moto, é fácil passar do ponto nas retomadas e visitar o chão. A eletrônica mostrou que funciona e olha que eu testei.
XC, a devoradora de curvas
Hora de navegar em outros mares portugueses dessa vez com a versão XC: as serras da região do Faro com suas estradas repletas de curvas. Um banquete para quem gosta de devorar curvas ao comando de uma moto, passamos por Tavira, Cachopo, Casas Baixas e Loulé, entre outros povoados. Durante o trajeto de mais de 200 quilômetros, tivemos a oportunidade de rodar em diversas condições de piso e clima: o sol alternou-se com chuva, alterando a aderência das grandes retas e curvas de todo tipo de raio e velocidade, enfim, um bom laboratório para avaliar a nova Scrambler 1200 da Triumph. Na maior parte do tempo, acelerei no modo “Road” — usei também o “Rain”, na pista molhada e escorregadia —, que ofereceu mais controle com respostas suaves ao acelerador, mas sem abrir mão da emoção. O estilo clássico é antagônico ao comportamento, pois parece uma naked moderna que ataca as curvas com agressividade e precisão. A versão XC tem curso de suspensões menores e menor ângulo de cáster, mais próximo de uma esportiva. Escolha acertada da Triumph, que deu mais agilidade à versão XC.
Nas retomadas de saídas de curva, o motor se desinibe acima dos 4.000 rpm, com retomadas agressivas, com a transferência de potência e torque para a roda feita de forma quase instantânea! Em virtude do traçado revirado das serras portuguesas, a moto permitiu atitude agressiva sem sustos. Pêndulos não eram obrigação, mas foi preciso fazê-los para contornar algumas curvas com mais emoção e efetividade, o que classifica a Scrambler 1200 XC como devoradora de curvas!
O êxito do projeto que mescla o clássico com conteúdo moderno tem a ver com o centro de gravidade mais baixo, se comparado à XE. A moto permite ângulo de inclinação insano — pobres das pedaleiras! Mais uma prova de que o projeto ciclístico foi bem parido e topa uma tocada esportiva. Os freios também conversam bem com o conjunto. Em situações extremas, na qual os freios foram exigidos próximo do limite, a moto não saiu da linha e parou com eficiência, de forma equilibrada com a modulação do ABS de atuação em curvas.
Conclusão
A XE é um moto feita para o cara que, além de gostar do estilo clássico, tem vontade e capacidade de fazer off-road. Já a XC é para quem quer pegar a estrada para curtir o passeio com estilo e conforto. Em comum, esses caras poderão conectar, por exemplo, em interface exclusiva suas câmeras GoPro pelo painel de TFT para registrar as andanças. Nele também há um sistema de navegação “turn-by-turn”, desenvolvido em parceria com o Google. A Scrambler ainda é uma moto raiz, com cara de moto, sem frescura estética, nem penduricalhos desnecessários. Sua simplicidade e qualidade técnica vai agradar aos motociclistas mais experientes que não querem mais do mesmo.
Seu sucesso vai depender do preço. Os valores para o Brasil ainda não foram divulgados, mas, no Reino Unido, partem de 11 500 libras para a XC e 12 300 libras para a XE. Mais de R$ 56 mil e de R$ 60 mil, respectivamente. Lá seu posicionamento de preço é próximo ao da Thruxton R, vendida aqui por R$ 58 mil.