O Projeto Motostory mostra como foi a saga dos amigos Ermelindo Frediani e Clovis Ricci e suas Norton ES2 em uma viagem Brasil afora no ano de 1949
Texto: Carlãozinho Coachman
Fotos: Acervos Edgard Soares / Motostory
Os momento mágicos do Motostory seguem nos presenteando com histórias riquíssimas e absolutamente inesperadas. Mais uma vez, dias atrás, entra um contato através de nossas redes sociais: “Oi, Sou a neta de Ermelindo Frediani e tenho uma história para contar de meu avô e sua Norton. Você poderia me ajudar?” Assim chegou para mim uma daquelas histórias que jamais conheceríamos se não fosse a vontade da neta de manter viva a memória da família e a incrível e inusitada história de duas Norton ES2. Aline é escritora (já tem dois livros publicados) e agora prepara a história de Ermelindo Frediani e Clovis Ricci e suas Norton, e a saga, em 1949, que os levou até a região Norte do Brasil.
Digo que não veríamos esta história não fosse a persistência dos Frediani, porque não se tratava de ilustres motociclistas, comerciantes do negócio, jornalistas ou pilotos e suas vitórias e façanhas nas pistas. Era gente “comum” – bom, nem tão comuns assim. O relato pleno desta viagem até a região amazônica será contado em novo livro de Aline, em parceria com o Motostory, mas resolvemos adiantar, com a autorização da família, algumas das curiosidades dessa verdadeira odisseia.
Abaixo a transcrição de parte do depoimento de Eduardo (filho de Ermelindo) e Aline Frediani (neta) em visita ao escritório do Motostory quando nos trouxeram esta deliciosa história.
“Meu avô Ermelindo Frediani e seu amigo Clovis Ricci fizeram uma viagem quase inacreditável de moto até a região Norte do Brasil, em busca de sonhos e oportunidades. Tudo o que temos para contar desta viagem nos foi contado por ele e seu amigo, ao meu pai e irmãos e que depois chegou até mim. Estamos agora entrevistando outros personagens das duas famílias para montar este quebra-cabeça. Muitos dos registros da viagem em si desapareceram e mais tarde vocês entenderão a razão. Quando meu avô e o Clovis começaram a planejar a viagem, ele (meu avô) trabalhava em uma instituição financeira como contínuo, ainda muito jovem, mas já dispunha de uma parte do dinheiro necessário para a compra da moto, mas seu amigo Clovis, ainda não. Assim, a compra das duas Norton e a partida foi sendo adiada até que eles pudessem finalmente realizar a viagem rumo à Amazônia.
O atraso na partida permitiu que a dupla se preparasse um pouco mais para a jornada, escolhendo com cuidado o que levar de roupas, a barraca onde dormiriam e a pensar como carregariam o combustível extra e as suas armas. Sim, duas espingardas (como se dizia) e duas pistolas. Serviriam para a proteção e também para caça.”
Hoje em dia as grandes viagens se tornaram bastante comuns, naquela época ainda era raro encontrar viajantes motociclistas nos confins do Brasil, por isso a dupla era recebida por onde passava com um misto de perplexidade e camaradagem. Muitas vezes foram convidados a conhecer prefeitos e pessoas importantes das cidades, desfrutando de refeições em casa de família e dormindo nas propriedades.
Também não foram poucos os percalços, e foi exatamente a parte dura que tornou essa viagem tão especial. A chegada a Belém foi o primeiro grande golpe e ficou marcada para sempre na memória. De pistola na cinta, mas com toda bagagem deixada nas motos (espingardas inclusive), resolveram comer algo em um bar da cidade.
Como em cena de velho oeste, um sujeito entra no bar indagando: – “Quanto querem pelas motos lá fora?” – “Não estão à venda. Estamos em viagem com elas”, responderam, já colocando as mãos sobre as pistolas. Atrás do homem começaram a surgir outros, todos armados, até que a dupla fosse cercada. “Moço, faça seu preço que tudo se resolverá bem”. Acharam melhor “vender” e trataram de pedir algo como dez vezes o valor das motos. Um saco cheio de dinheiro foi trazido. “Deve estar tudo ai. Podem carregar as motos no caminhão.” – “Espera. E nossas coisas? Precisamos da bagagem.” – “Moço, acho que você não entendeu. O senhor vendeu tudo”. e partiram.
Com dinheiro em mãos e mais nada, descobriram a crescente onda de mineração na região e resolveram empreender. Partiram para Manaus em busca do eldorado, mas as dificuldades e, principalmente, a malária acabariam com o sonho da dupla. Com as dificuldades e o dinheiro investido em equipamentos, o sonho acabou. Foi preciso a ajuda da família, que chegou a mandar dinheiro, para que pudessem retornar a São Paulo sãos e salvos, para nunca mais verem as Norton de novo. A paixão por motos ficou para sempre no DNA da família, mas esta é outra história.
Texto publicado na edição 260 da revista MOTOCICLISMO
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