<p>A bordo de minha motocicleta, dobro a esquina e aperto os olhos para enxergar alguns quarteirões à frente. O clima está levemente frio e com uma garoa fraca que identifico pelas gotículas que se formam na minha viseira. Parece que há uns cinco cachorros deitados a três quadras de onde estou.</p>
<p>Fixo os olhos neles e percebo que eles estão me observando, ainda sem muito interesse. Um deles, malhado, parece ser o mais interessado. Está de olhos fixos em minha direção e parece que já me tem em seu radar. Duas quadras de distância e mais dois notaram que o malhado me notou e que eu notei todos olhando na minha direção.</p>
<p><img alt="Entre os habituais latidos, as perseguições e a correria, os cães apenas querem celebrar sua amizade por nós " height="467" src="http://carroonline.terra.com.br//motociclismoonline/staticcontent/images/uploads/cachorro_motocicleta_motociclismo_620x467.jpg" style="margin:0 auto; display:block;" width="620" /></p>
<p>O branquinho com cara de invocado e outro cinzento tomam a iniciativa e se levantam olhando fixamente para mim. Num piscar de olhos, estou quase a uma quadra da matilha, todos os cães estão de orelhas em pé me observando com toda a atenção do mundo. Chegando a uns dez metros dos cães, o malhado, que parece ser o líder, coloca-se em movimento em rota de colisão comigo.</p>
<p>Como que se numa comunicação telepática, todos de forma meio desordenada seguem o mesmo caminho e avançam latindo para cima da minha moto. Numa caótica perseguição acelero e consigo passar a frente deles. Um pequeno, que parece um foguete, consegue me acompanhar.</p>
<p>Olho para o lado e vejo esse nanico e mais um grande correndo, latindo e me olhando atentamente. Os olhares não são de agressividade, ódio ou de desgosto, pelo contrário, para um observador atento que tenha um mínimo de empatia pelos animais rabudos que latem, percebe que é quase uma saudação desordenada e barulhenta.</p>
<p>Em um movimento brusco, desacelero e freio a motocicleta. Dois dos cachorros passam por mim e os outros da matilha silenciam. Disfarçam e, meio que sem jeito, ficam me olhando já de orelhas baixas e com olhar amistoso. Paro a moto e vários deles já estão abanando o rabo. Reflito rapidamente que essa atitude só pode ser da natureza dos cães. Nunca vi gatos fazerem isso.</p>
<p>Será que vem dos seus ancestrais lobos que corriam atrás dos humanos primitivos e esse instinto ainda permanece em algum lugar do inconsciente coletivo? E, frustrados por não conseguirem acompanhar a marcha de um homem em uma velocidade alta, simplesmente reclamam e clamam por quererem estar juntos? Sei lá. Só sei que ao retomar a aceleração da moto, o malhado insiste em vir atrás trotando e abanando o rabicho.</p>
<p>Já estou quase entrando na rodovia e sou obrigado a parar, descer da moto e esperar ele se aproximar. Rebolando-se todo, ele chega ao meu alcance meio que sem jeito. Estico minha mão com a luva e toco sua cabeça, os olhos dele brilham e ele lambe o couro da minha palma. Agora tenho certeza que ele queria dizer “desculpe pela bagunça toda, só queria lhe saudar!”</p>
<p>Keep riding!</p>