A Serra do Rio do Rastro é desejo latente de muitos motociclistas. Viajar para longe, explorar, sentir o vento e sentir-se pequeno diante do mundo são sensações comuns de quem passa por ali cravada entre curvas e paredões.
Nosso tour para a Serra do Rio do Rastro já começou descendo a Serra do Cafezal, próximo a São Paulo, agora duplicada, sem trânsito e com um belo visual. Seguimos pela maior rodovia federal do Brasil cruzando também a bela e mortal Serra do Azeite para chegar até a entrada da Estrada da Graciosa.
Texto e fotos: Tom Pederneiras
Edição: Alexandre Nogueira
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Essa estrada merece um parágrafo à parte. Em meio à maior reserva de mata atlântica do Brasil, a estrada que era usada pelos tropeiros e suas mulas liga o litoral à serra. Não bastasse ser cheia de curvas, íngreme e calçada de paralelepípedos, o que aterroriza muitos pilotos em dias de chuva, ela é enfeitada de hortênsias azuis. Antes de começar a descida, paramos para fotos no icônico portal barroco à beira da BR-116.
Após a descida, cruzamos alguns rios com muitas pedras e alguns banhistas e seguimos até chegar aos casarões de época em Morretes, já no Paraná. A charmosa cidade floresceu à beira do rio Nhundiaquara. Experimentamos lá o tradicional barreado no restaurante Madalozo à beira do rio. A carne é feita em panela de barro e servida com farinha, banana e demonstrada detalhadamente pelo garçom.
Não é possível passar por Morretes e não comer mais do que se deve. Enquanto nos recuperamos, atravessamos nossas motos de balsa entre Caiobá e Matinhos no litoral para então acessar a Estrada dos Príncipes que nos levou a Joinville, SC. Para jantar no estilo da cidade, comemos em um restaurante alemão com direito a salsichão, joelho de porco e tartar.
Seguindo para o sul
No dia seguinte trocamos a BR116 pela 101 e de tempos em tempos avistávamos o mar e a imensa ilha de Florianópolis. Paramos para almoçar em uma das praias mais lindas do Brasil: a Guarda do Embaú, onde o rio da Madre não tem pressa de chegar ao mar e cria desenhos com água, areia e gôndolas. Ali almoçamos no Guarda a Gosto e o melhor prato (que não está no cardápio) é o Camarão da Jane – fica a dica! Enquanto o prato era preparado, fizemos uma caminhada até a costa de pedras.
São tantos lugares lindos que quase perdemos o foco. Então orientamos o GPS para o Rio do Rastro. Saímos da BR101, em Tubarão, e dai para frente tudo muda. O visual serrano da região parece ter parado um século atrás, tudo é à base de pedra, madeira, vacas e curvas. Após Lauro Müller, SC, as placas para a serra aumentam a ansiedade dos viajantes. A subida começa discreta e aos poucos as curvas e o relevo vão aumentando. Em pouco tempo estamos pilotando com o paredão perpendicular de pedra a nossa esquerda e o imenso vale à direita.
Então começam os cotovelos e ao olhar para cima vemos a estrada subindo como em degraus, serpenteando o paredão. Conforme subimos, mirantes vão aparecendo nos cartões-postais da serra. Lá em cima a expectativa para ver (se a neblina deixar) a estrada. Às vezes é preciso esperar, outras vezes não tem jeito, a serra não se mostra.
Nos hospedamos no hotel Rota dos Cânions, em Bom Jardim da Serra, SC. Um palácio rural entre cânions e araucárias. Da janela dos quartos ou do salão de jantar com lareira admiramos o visual do alto das nuvens onde o tempo parece ter parado, oferecendo uma taça de vinho. Uma vantagem de se hospedar neste hotel é estar a 7 km da serra, propício para voltar à noite e percorrer suas curvas iluminadas. Nessa hora a cerração transforma tudo em um filme fantástico, onde luzes difusas iluminam a névoa e fazem o contorno das motos parecer fantasmas dançando na brisa gelada.
O dia amanhece e a luz preguiçosa da manhã dá vida à paisagem serrana. Cerca de 70 quilômetros de ótima estrada, repleta de curvas e pequenos vilarejos, nos separam de Urubici. A cidade mais alta do Brasil é um parque de diversão para os motociclistas. Em seu cardápio de cartões-postais temos: o Morro da Igreja com a Pedra Furada no ponto mais alto, a Cachoeira do Avencal com mais de 100 m de altura, a belíssima Gruta Nossa Senhora de Lurdes, o posto Serra Azul com tema vintage, o saboroso Paradouro Santo Antonio e a imperdível Serra do Corvo Branco, a maior fenda do mundo com uma estrada dentro. Para chegar a ela o piloto pega uma terrinha, mas o grande desafio é sua descida, íngreme com asfalto péssimo, personalidade do corvo. Na volta a foto clássica entre os paredões.
Churrasco na serra
De volta ao Rota dos Cânions, à noite comemoramos o “raid” serrano com um churrasco gaúcho no celeiro do hotel com direito a sanfoneiro. A comida, bebida, risadas e o choro do acordeão invadem a noite da serra. Acordamos mais tarde para começar nossa volta sentido São Joaquim, a cidade que se destaca pela produção de vinho e aproveitamos para visitar a belíssima vinícola Villa Francione. O caminho até Lages foi a despedida das inesquecíveis estradas das Serras Catarinenses. A partir de lá a BR-116 ocupou boa parte do dia até Santa Felicidade em Curitiba onde jantamos em suas tradicionais cantinas italianas.
Último dia, mas a viagem está longe de acabar. Quase 1.300 curvas do Rastro da Serpente nos separavam de São Paulo! A estrada famosa entre os motociclistas possui 250 quilômetros praticamente sem retas, equilibrando-se na crista da montanha. O asfalto é um tapete e quem gosta de pilotagem se divertiu. Em Apiaí, no meio da estrada, a foto é obrigatória sob a placa da serpente. Em Capão Bonito, mais uma edição da placa e mais um bar temático de moto, o Porthal do Rastro da Serpente. Antes de chegar à capital, um cafézinho para as despedidas no Casarão 54.
Foram cinco dias repletos de pilotagem, serras incríveis e sabores típicos do Sul do Brasil. Hortênsias, paralelepípedos, o mar, cânions, araucárias, cachoeiras, pedras furadas, carne, vinho, cantinas, sorrisos de alegria sob os capacetes e muitas curvas. Esses foram os ingredientes da melhor receita de viagem para o principal destino dos viajantes de moto do Brasil.
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