Se no mercado mundial as motos clássicas da Triumph têm peso de praticamente metade de seu faturamento, no Brasil, embora as motos de apelo de época tenha feito sucesso, são as maxitrail que comandam a caixa registradora inglesa. Até maio deste ano, segundo o registro de emplacamentos da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), a Triumph tem uma participação de 0,57% de todas as motocicletas emplacadas no país, o que significa 1 784 unidades de seu line-up, sendo que a Tiger 800 é responsável por 975 unidades, ou seja, esta maxitrail inglesa representa quase 55% das vendas da marca no país e que obviamente caiu no gosto do brasileiro.
A linha Tiger 800 é, de longe, o modelo com a mais extensa variação de opcionais de todas as marcas aqui no país, sendo seis versões baseadas no mesmo motor e chassi. Logicamente a Triumph busca atender uma faixa de consumidores maior com bolsos de diversas capacidades, desde a versão XR, a mais em conta, que parte de R$ 43 190, até a XCa, a mais cara e completa de todas, com preço sugerido de R$ 55 890, diferença capaz de comprar boa parte dos scooter de até 200 cm³ à venda no país. As versões não só atendem as diferentes capacidades financeiras, mas principalmente a uma grande variedade de utilizações que os motociclistas podem dar à moto.
Se você esta com grana, quer comprar uma Tiger 800 e está em dúvida para escolher qual delas levar para a garagem, pense no que é importante para você na motocicleta que vai comprar. Há coisas que são óbvias e que mesmo não querendo você vai levar, como freios ABS, controle de tração e tomada 12 volts, por exemplo que são itens de série em todas as versões. Já rodas raiadas, protetores de motor, faróis de milha, aquecimento de manoplas, modos de pilotagem e piloto automático você vai encontrar apenas nas versões mais sofisticadas e caras da Tiger 800. Outros diferenciais são os faróis de LED direcionais e painel em TFT colorido, muito funcionais e que valorizam o estilo agressivo e moderno das 800. As mais completas também receberam suspensões WP (pertencente a austríaca KTM) reguláveis, permitindo ajustes mais finos. No sistema de freios também há diferenciação, pois as topo de linha vêm equipadas com pinças dianteiras da marca italiana Brembo, e as demais têm pinças Nissin.
Nosso superteste foi realizado com a XCx — não estranhe se você reparou em alguns acessórios extras. Os faróis de milha e os suportes para as três malas são equipamentos da XCa que estavam instalados na “nossa” moto.
Mais nova por dentro do que por fora
A XCx é imponente, seu tanque com capacidade para 19 litros de combustível é largo, os protetores laterais do motor encorpam a largura e o para-brisa alto (com cinco regulagens de altura) dão a sensação de ela ser muito maior do que é ao estar sobre o assento. Sentado no banco, os pés ficam quase totalmente apoiados no chão, o tanque é estreito entre pernas, ajudando a encaixá-las para pilotar, tanto sentado como de pé, no off road. Entre as tantas modificações em relação ao modelo anterior, na ergonomia percebe-se o guidão mais próximo do corpo do piloto, favorecendo qualquer tipo de manobra. O banco desta versão pode ser regulado em duas alturas, 840 e 860 mm, mas para quem quer ficar totalmente apoiado, sem o desconforto de tocar apenas as pontas dos pés no chão, os ingleses desenvolveram a versão XRx Low com altura do banco de 760 mm, mais próximo do solo. A estrutura multitubular em aço do chassi (tipo treliça) é bem compacta, rígida e que combina com o conjunto de suspensões muito bem.
A perda de peso da nova família combinou muito bem, com dirigibilidade excelente e, mesmo com a roda raiada de 21 polegadas na dianteira e pneu estreito (90/90-21) de utilização mista, ela é muito empolgante para contornar curvas por estradas sinuosas, e logo você se pega pensando: “quanto mais curvas no caminho, melhor, pois ela foi feita para isto, mas não, afinal ela é uma moto voltada para uso misto, o que é impressionante. A moto não teve muitas mudanças em seus números de potência e torque, com 81,5 cv a 8810 rpm e 6,97 kgf.m a 7830 rpm, respectivamente, verificados em nosso dinamômetro. Mas, os engenheiros ingleses fizeram muitas alterações internas, entre elas nos comandos, alimentação e alívio de peso de componentes, o que o deixou muito mais esperto.
A nova relação de câmbio, com a primeira marcha mais curta, também ajuda nesse sentido. O sistema de escape também foi redimensionado e agora a ponteira emana um ronco mais rouco e sedutor, e o singular assovio dos três cilindros girando continua como marca registrada. A disposição do motor mudou bastante também, pois antes ele só acordava de médias para altas rotações, e agora a pegada é mais incisiva desde giros mais baixos. O câmbio mais curto dá um punch inicial mais frenético e viciante, e o som emitido pela nova ponteira instiga a fazê-la berrar, acentuando o prazer sonoro contemplado no projeto.
Nesta versão da Tiger há cinco modos de entrega de potência do motor (Road, Rain, Sport, Off Road e Off Road Pro).C om eles se pode escolher o comportamento do motor ao girar o punho direito e o ABS e o controle de tração também funcionam de maneiras distintas em cada um. No modo Off Road o controle de tração deixa a moto derrapar levemente nas acelerações e o ABS permite travar o freio traseiro, já no Off Road Pro os dois sistemas são desligados, deixando a cargo da habilidade do piloto todo o controle da aceleração e freios. Duvido que algum motociclista com alguma experiência na terra não fique provocando a moto para deixá-la rebolar para os lados como se fosse uma dançarina da dança do ventre querendo provocar a plateia, mas levantando terra e arremessando pedras para trás, com a agilidade e a facilidade na condução de uma moto feita para o esporte fora de estrada.
Pequenos Saltos
As suspensões desta XCx têm curso suficiente para arriscar pequenos saltos. Na dianteira as bengalas de 43 mm percorrem generosos 220 mm até chegar ao seu limite, e na traseira o amortecedor, com 5 mm menos de curso, é valente e oferece grande capacidade de absorção de impactos sem incomodar o piloto com a transferência de energia para o corpo ou guidão. Foi preciso fechar um pouco as vias hidráulicas das bengalas de retorno e compressão para me sentir mais à vontade, já que estavam se movimentando demais pra meu gosto. Para minha surpresa, quando fui tentar regular o amortecedor, não o consegui porque no estojo de ferramentas não tinha o apetrecho adequado para fazê-lo, e inclusive a área onde fica o parafuso da regulagem está muito próxima do escape, aumentando o risco de queimaduras.
No trajeto de terra que percorremos com todas as motocicletas de utilização mista, a Tiger 800 foi parceira impecável, encarou buracos, valas, subidas, descidas e cascalho com o mesmo apetite que devorou o asfalto. Não importa por onde você se meta a andar com a Tiger, pode ir que ela vai lhe obedecer e dar prazer tal qual namorada nova, e você não vai querer sair de cima dela. A competência dessa motocicleta em qualquer situação é incrível, além de ser confortável. É impossível imaginar uma moto boa em tudo e, ao pregar a mão no freio, ter aquela sensação desagradável do manete descendo quase até encostar nos dedos sobre a manopla do acelerador.
Para mim, por maiores que sejam, suas virtudes perdem o brilho, ofuscadas por um sistema de freio ineficaz. Por outro lado, quando você anda com uma motocicleta quase perfeita e o sistema de freio acompanha o desempenho da moto, parece que todas as notas são mais valorizadas. É o caso desta Tiger, pois seu freio é potente e tem a mordida forte, suficiente para dar a tranquilidade de acelerar sabendo que se for preciso ele vai responder rápido, com bom tato e, se preciso, vai livrar você de uma situação de emergência.
Outro equipamento que valoriza o design e chama a atenção desta 800 é a iluminação combinada por lâmpada halógena e LED, que além de bonito esteticamente é bastante funcional. Admirável também é o painel em TFT colorido. Além de trazer todas as informações sobre o funcionamento da motocicleta, é através dele que conseguimos configurar os modos de condução (com o auxílio de um joystick no punho esquerdo). O painel permite, inclusive, mudar seu layout de apresentação de informações ou cor de fundo. Bem-vindo a uma nova era, já que nas novas gerações de modelos este tipo de “acessório” já não vai mais ser um opcional. Quem quiser ser competitivo, independentemente da categoria, será quase “obrigado” a utilizar este tipo de tecnologia se quiser seduzir os motociclistas.
As New Tiger 800 — como a marca inglesa chama seu bando — são motos dóceis no manejo e competentes para encarar qualquer situação. A ampla gama de opções que a Triumph oferece comprova o interesse e importância do país para a marca. Um exemplo a ser seguido.
Conclusão
Fiquei surpreso com o desempenho desta Tiger. A XCx se mostrou muito competente e divertida em qualquer situação, destacando-se a leveza para pilotar, a agilidade e o excelente pacote tecnológico que permite deixá-la a seu gosto para deleitar-se, seja no asfalto, seja no fora de estrada. Senti falta de uma ferramenta para ajustar o amortecedor traseiro, que parece ser especial. O preço parece um pouco elevado, mas está bem ajustado se comparado às motos concorrentes que colocamos na página anterior, principalmente pelo nível de equipamentos de série.
Texto: Ismael Baubeta
Fotos: Renato Durães