Aproveitamos que a Carolina Yada — repórter especializada em competições — estava com o time brasileiro no Motocross das Nações 2018, para conseguir uma entrevista exclusiva com o Antônio Jorge Balbi Jr, ex-piloto multicampeão que hoje é chefe de equipe no motocross. Veja como foi essa conversa:
Gostaria de uma análise sua sobre a atual fase do Motocross brasileiro.
É difícil a gente comparar fases, mas é uma das melhores fases talvez. Temos uma geração de jovens pilotos muito bons, incluindo esses três que estão representando o Brasil no Motocross das Nações, mais um dois ou três no Brasil que tem grandes chances de levar o Motocross Brasileiro a um nível que nunca vimos antes.
Você sofreu um acidente sério há dois anos e hoje vive uma nova fase. Resume um pouco como está a sua carreira hoje.
Tive um acidente exatamente há dois anos e um mês. Ainda estou em processo de recuperação. Mas é legal demais essa nova fase. Tenho um time no Brasil, a Kawasaki Pro Tork Racing, com dois pilotos na categoria MX2 e surgiu a oportunidade de trabalhar também com o time do Motocross das Nações. Eu que tive a alegria de representar o Brasil tantas vezes e consegui levar o Brasil às finais quatro outras vezes. Foi muito legal poder voltar ao Motocross das Nações e junto com esse time classificar novamente. De uma maneira diferente, mas bastante emotiva. Muito legal poder trocar experiência com os meninos. O Gustavo Pessoa em especial, a gente tem um relacionamento muito bom, ele me escuta bastante então foi legal poder tentar ajudar. O Enzo também, o Fabinho, enfim, são três garotos que tem futuro e eu acho que é o time do Motocross das Nações nos próximos três ou quatro anos já que são muito jovens. O Enzo já está (competindo) fora, o Gustavo pretende continuar fora e o Fabinho vem ai para ser o maior nome do motocross brasileiro. O que a gente viu aqui nos Estados Unidos eu acredito que seja uma nova fase do motociclismo brasileiro.
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Para você estar no Motocross das Nações com o time dessa vez foi feita uma “vaquinha” na internet, uma mobilização de fãs, conte para nós como foi e como se sentiu com tudo isso.
Pois é. Na verdade a gente vinha conversando junto com a CBM e com o Cacau (Manuel Carlos Hermano, chefe da equipe brasileira no Motocross das Nações). As verbas do time foram reduzidas nas vésperas da viagem. Acabou que eu não poderia vir, falei na rede social tudo que estava acontecendo. Ai alguns fãs resolveram fazer uma vaquinha. Não partiu de mim. A principio eu relutei um pouco, pois não achava justo os fãs terem que pagar, já que temos uma confederação que cobra anuidade dos pilotos, já que temos empresas envolvidas. Mas eles quiseram, insistiram, fizeram a vaquinha e foi incrível. Em 48 horas a gente arrecadou um valor muito alto e fiquei muito feliz, eu não acreditava que meu nome tinha tanta força ainda. Então é bacana demais de saber que os fãs tem muito carinho pelo Balbi ainda e mais feliz ainda de ter vindo e contribuído com o time.
O que a gente pode fazer mais para melhorar o esporte a motor no Brasil?
Sinceramente, é difícil, mas o que acho que realmente falta no Brasil são pessoas envolvidas que realmente gostam e amam o esporte. São ex-pilotos em cargos de chefia, em marketing esportivo, em chefia nas equipes e até mesmo na Confederação Brasileira. Infelizmente tem pessoas que nunca viveram do esporte tomando decisões e isso acaba fazendo com que em algumas situações a evolução do esporte não seja o primeiro objetivo dessas pessoas. Eu não preciso citar nomes, mas acho que a gente precisa de mais apaixonados pelo motociclismo envolvidos, na direção de empresas, de fabricantes, de equipes, na confederação brasileira, nas federações estaduais. Eu acho que só assim o esporte vai conseguir crescer. Não é necessário que sejam somente ex-pilotos, mas pessoas que viveram do esporte, pessoas que realmente são apaixonadas pelo motociclismo e não empresários ou pessoas que visam o lucro em primeiro lugar e não o esporte.
Você tem muita credibilidade, inclusive no exterior. Toda vez que estamos em algum evento você é sempre citado, as pessoas te mandam recado. Você se enxerga em uma posição de dirigente? Como você analisa essa possibilidade ou nunca pensou nisso?
É difícil, quando piloto jamais me enxergava nessa situação. Todo mundo dizia que um dia eu ainda seria dirigente do esporte. Sou apaixonado pelo esporte e a única coisa que queria era andar de moto e achava que uma vez que parasse eu iria até as corridas, mas para me divertir. Mas eu vejo que faz falta, que não tem pessoas capacitadas para assumir esse cargo. Então caso venha a acontecer alguma oportunidade, eu acho que pensaria a respeito, apesar de estar muito satisfeito na chefia da minha equipe, a Kawasaki Pro Tork Racing. Quem sabe, talvez, manter a equipe e ter algum outro cargo em conjunto, se possível. Mas eu acho que é coisa que temos que esperar acontecer.
E quanto a minha credibilidade no exterior, é muito legal. Corri muito anos, estive no AMA Motocross, eu fiz vários amigos na Europa, nos Estados Unidos e graças a Deus eu tive a felicidade de ter bons resultados. Top 5 no AMA, Top 10 no Mundial, Top 5 no Motocross das Nações e acho que isso fez com que as pessoas conhecessem o Balbi e também o nosso país através disso então é muito legal. Muita gente ficou feliz de saber que eu estava trabalhando com o time do Motocross da Nações, o pessoal da indústria, enfim, todo mundo que participa. É bacana demais receber esse carinho e sou apaixonado por isso. Eu estava falando com o pessoal sobre quando cheguei aqui. Foi a primeira vez que senti vontade de andar de moto desde o meu acidente. Eu senti uma vontade incontrolável, que me deu um nó na carga, que desceu lágrima. Tenho muita história nesse lugar. A vivência do motociclismo é diferente. O motociclismo nos Estados Unidos e na Europa é como o nosso futebol. As pessoas amam. São milhares de pessoas a cada fim de semana nas pistas, entre pilotos e público. As pistas são maravilhosas. Isso é o esporte como deve ser feito. Nesse sentido de organização de eventos, o Brasil está engatinhando e a gente precisa tentar trazer promotores para fazer o esporte crescer, porque a gente tem um mercado de motos para isso. Vende-se muita moto no Brasil então não tem porque a gente não estar um dia mais próximo de grandes mercados de motociclismo com nossos eventos.
Fale um pouco sobre sua relação com a Mariana Balbi, sua irmã e piloto, que está sempre do seu lado e é braço direito na gestão da equipe.
É desde cedo, a gente sempre foi muito companheiro. Ela começou a correr por minha causa. Ai eu vim para os Estados Unidos e eu vi que tinha campeonato de mulheres e notei que minha irmã corria melhor que elas. Estava correndo aqui, me sacrifiquei e comprei uma moto para ela. Mandei a passagem. Ela veio correr e na primeira brigou e já conquistou um pódio. A gente sempre teve uma trajetória juntos. Não só minha irmã, pois a família Balbi é muito unida. E agora uma nova família eu comecei com minha esposa e filho. A gente é apaixonado pelo motociclismo e a Mariana me ajuda muito e com a minha deficiência física mais ainda, pois lugares onde eu não conseguiria chegar ela faz questão de me ajudar a conseguir chegar. Então isso é muito bacana. Mas isso foi uma vitória também, a minha primeira viagem internacional e andei muito nesse fim de semana de Motocross das Nações, tinha lama, eu subi e desci escadas e graças a Deus foi um teste físico para mim e eu estou muito feliz de ter conseguido. Fui na largada com os meninos, andei muito aqui. Enfim, foi uma realização pessoal, porque eu sei o tanto que eu luto junto e ao mesmo tempo contra esse corpo, que às vezes não quer responder aos estímulos que dou a ele. Então continua um atleta 100% vivo dentro de mim, faço fisioterapia todos os dias quando estou no Brasil e acho que foi um teste legal, estou muito feliz com essa vitória.
Que marcas continuam te apoiando hoje, depois do acidente, que enxergam o Balbi não só na época de piloto, mas que enxergam um pouco além, como um influenciador do motocross?
Eu tenho muito para agradecer à Kawasaki e à Pro Tork, são as duas principais marcas. A Scud também me dá um super apoio. A Kawasaki meses depois do acidente, quando souberam que eu não teria chance de voltar a competir, me chamaram para uma reunião e tiveram uma ideia de que eu continuasse cuidando da equipe, que fizesse a gestão da categoria MX2. E foi daí que nasceu a ideia da equipe e eu fiquei muito feliz com isso. A Pro Tork que já está comigo desde 2010, já vamos para oito anos juntos. Tudo que eu faço eles apoiam. A Scud também, tenho um relacionamento muito bom com o Henrique, que é o presidente da empresa. E outras empresas também continuam apoiando, então isso é muito legal. Sou muito grato a essas empresas que enxergam e não deixa de ter sido um teste bom nesse final de semana. O público financiar a minha vinda, eu sinceramente fiquei surpreso. Acho que se a gente tivesse feito algo programado talvez, com meses para conseguir seria fácil, mas na semana, em 48 horas a gente conseguiu. Isso foi muito legal, fiquei muito feliz e grato. Agradeço muito a essas pessoas. O time brasileiro, com mérito 100% do Enzo, do Gustavo e do Fabinho conseguir ir super bem e classificar. Se eu tiver ajudado 1% nisso ai, acho que o público brasileiro está feliz com isso e agradeço o presente que eles me deram.
Fotos: Tiago Lopes